Desiludido, vinha eu, quando nossas vidas colidiram. Ao sabor do swing caprichoso de um boi-bumbá, mesmerizado pelo teu balançado, minha dor evanesceu. O olhar de soslaio que me enviava e tua amiga sequer desconfiava. Eu te via bela, cabelo ao vento; tu me vias estranho, vindo de um lugar chamado desconhecido. Hipnotizava-a ao passo que capitulava. E quando, tépido, busquei libertar-me, aprisionaste-me, faceira, na maciez dos teus movimentos. No vai e vem da coreografia, nossos olhares acompanhavam o compasso da música. Cor de jambo, gosto de quero mais.
Fitamo-nos sempre e ficava cada vez mais claro o porvir: corridinhas espúrias, o arfar pecaminoso, a tesa tez. Como um arúspice, adivinhei nas tuas entranhas nossa sorte. As curvas simétricas do meu desejo viam em ti a realização de sua matemática. Disse-me o calor amazonense que era preciso a onça beber água. O doce néctar dos melífluos lábios de uma mulher para aplacar o mormaço. Arrefecer os indeléveis ardeurs da nossa vontade. E tu disseste sim; sim para água, sim para o beijo, sim para meus braços e meus abraços.
Tiveste o que queria, tomaste minha paz. Num turbilhão de dedos, sensores táteis, tu escrutavas meu ser. Teu recato, embebido de luxúria, dominava minha veleidade. Toma-me teu, mata-me agora, mas nunca parta. Não vá, Iracema amazonense, quede-se um pouco mais neste etéreo devaneio. Rijas mamas contra meu peito nu, deixa-me eternizar teu nome nesta ode a tua beleza; tatuá-lo em meu corpo, na minha alma. Ouviste meu coração partir? É por ti, por ti que a intransponível distância de nossas díspares existências roubou-me.
E o tempo sumiu. Busquei-o, este algoz fugidio como tu, mas escapou. Agarrei-me então à lembrança, como o carrapicho à calça, intentando a eternidade daquele momento. Congele! Pare! Abandone-me no fugaz presente, vida maldita, deixa-me estar aqui. Beija-me com força, suga-me ávida deveras, rebenta meu coração que bate descompassado. Meu nome é concupiscência; o teu, perfeição. Fui para sempre seu neste imortal instante que, lépido, apagou-se do presente. E cimentou, na memória, o inefável pesar da sua ausência; diuturno e dileto fantasma.
#Fz!